Um relato da rotina administrativa no Terceiro Setor.
Por Tiago Fagner Araujo
É muito comum, nós, que fazemos graduação em administração - ou mesmo um curso técnico - termos a percepção do nosso futuro em empresas, muitas vezes grandes, em meio a planilhas, papelada, xícaras de café e gráficos de lucratividade. Organizações de terceiro setor não fazem parte desse imaginário que aprendemos. Muitos, como eu, na época da graduação não saberiam escrever mais do que algumas linhas sobre o que eram essas organizações. Até que somos apresentados a uma, seja em uma visita ou mais profundamente em um estágio ou vaga de trabalho. A maior e mais óbvia diferença é que o trabalho não visará o lucro, mas alguma atividade de interesse público. Vamos trabalhar para minimizar alguma chaga social, ambiental, política e isso pode ser um fator motivador importante quando você adere a missão da organização.
Então, quando mal percebemos, lá estamos nós em meio a planilhas, papelada, xícaras de café e avaliando o impacto do trabalho da organização sobre a atividade realizada. A rotina do setor administrativo financeiro no terceiro setor, principalmente quando se trata de organizações de dimensões menores e com pessoal limitado, são principalmente suporte a outras equipes e cuidar da papelada. A equipe técnica estará diretamente envolvida com o trabalho fim e sujeita aos desafios e imprevistos que aparecerem, principalmente se o trabalho for externo. O papel do administrativo dentro dessa contexto é funcionar como uma suspensão que vai suavizar o impacto dessas situações, dando suporte na compra de materiais necessários, nas negociações com fornecedores, auxiliando a equipe a entender e realizar as minucias da prestação de contas das despesas de suas atividades contemplando todas as obrigações legais, ajudando a tirar dúvidas e a solucionar problemas, para que as rotinas e, principalmente, os imprevistos sejam superados da melhor maneira possível.
Também há um papel importante de suporte na tomada de decisão tanto da equipe técnica, quanto da coordenação. A produção e acompanhamento de orçamentos, o preenchimento de relatórios financeiros de despesas e receitas executadas, a sinalização de despesas que precisarão de mais recursos do que o previsto ou de despesas que estão com execução abaixo do planejado, a avaliação de quais fornecedores apresentam melhor relação custo x benefício, são algumas das muitas informações que podem ser repassadas para a equipe técnica e para a coordenação da organização para ajudá-los na tomada de decisões sobre os próximos passos do trabalho, mudando, priorizando ou realocando tempo e dinheiro nas atividades.
Além do suporte para um trabalho mais externo há, claro, o trabalho voltado “mais para dentro”. Cabe ao administrativo financeiro realizar uma radiografia do trabalho de campo, por meio da documentação gerada. Organizar pagamentos, conciliação bancária, documentos financeiros, contábeis, entre outros. Enquanto a equipe técnica molda o corpo do que é o objeto de trabalho da instituição, da forma aos contornos, as texturas; o administrativo financeiro permite uma visão de dentro, do esqueleto que montou esse corpo formado por um conjunto de recursos humanos, financeiros, de equipamentos e materiais. Esta organização também é parte fundamental da prestação de contas dos projetos para parceiros, patrocinadores e para a sociedade.
Claro, que dependendo do tamanho das organizações e da estruturação dela haverá modificações da forma de fazer e de quem faz o quê. Com equipes maiores e mais trabalho há também mais especialização das atividades, mas sem mudar a ideia do administrativo-financeiro como facilitador do trabalho de outras equipes, não tendo um fim em si mesmo, mas como parte inerente do que é uma organização, seja ela de terceiro setor ou não.
Olhando com esses anos de experiência fica claro que mais do que um nicho, o mercado para administração e finanças no terceiro setor tem se mostrado cada vez mais abrangente, com mais formação universitárias específicas de pós-graduação até mestrado disponíveis. Que mais do que o trabalho de organizações oriundas da sociedade civil que vão diretamente ao problema, capitaneadas pelo que, talvez, a maioria das pessoas chame de idealistas, o universo do terceiro setor engloba também grandes fundações oriundas de empresas, organizações que tem como missão acelerar e ampliar o impacto de outras menores e uma diversidade de profissionais que querem unir resultados com impacto positivo na sociedade. Em um mundo que ainda produz muita desigualdade e degradação, esse tipo de trabalho, seja por meio do Estado, seja por meio das organizações de terceiro setor continuará relevante e atual para os desafios que a nossa sociedade tem pela frente.
E após tantos anos, percebo que ao ingressar nesse mundo, fez total diferença saber que o meu trabalho, mais do que seria possível numa organização de segundo setor, estava impactando positivamente comunidades onde eu estava inserido. Que fazia diferença direta na vida das pessoas. E agora, dentro da experiência da FMA, fazendo parte de um esforço para conservação de ambientes e de animais que são importantes para o equilíbrio desses ambientes. Mais do que simplesmente um trabalho é uma contribuição para o futuro, um investimento em um mundo com menos desequilíbrio.
Foto: Acervo Pessoal do Autor